domingo, 29 de julho de 2012

O Grande Fingidor.

Não se esqueçam que não passo de um recém-adulto, com tiques de adolescência e com tiques de senilidade. Para gente como eu, o hoje deve se transformar no ontem e ser rapidamente esquecido e ultrapassado. Mas enquanto não se transforma, é tempo sofrido. Tudo e nada importam. Sejamos uns falsos deprimentes e atiremo-nos para um mar de revelações por um momento.

Um certo rapaz adorava falar de si próprio, como qualquer pessoa com os cinco alqueires bem medidos, mas apesar desta característica, não se deixem cair em ilusões, não era uma pessoa que se desse facilmente, e a sua sociabilidade tinha limites. Sempre foi muito teatral mas nunca foi dotado nas artes da representação. Nessas, não passava de um palhaço que todos julgavam que era bom actor porque disfarçava os seus maus jeitos com palhaçadas e loucuras, fingindo que era pior do que era. Mas no grande palco que é a vida, ele era um dos melhores actores. Representava bem, para o seu bem e para o dos outros, mesmo quando não parecia. De parvo não tinha nada. Mas por outras palavras, tinha tendências para a mentira compulsiva. Todos temos que tomar decisões. Certas ou erradas. Custam mais, na sua maioria, as decisões correctas. Custo de oportunidade. E embora novo, o rapaz sabia disso e considerava que tinha uma farta e extensa experiência de vida e dos seus sabores e dissabores.De parvo não tinha nada, mas tinha tiques de egocêntrismo.
Chegou o grande dia. Sofrendo de amores, teve que tomar uma decisão. A que lhe custaria mais, e a que menos queria. E foi um fingidor. Enganou para o bem dos outros, e sem eles se aperceberem. Provavelmente, o presumível leitor não está a compreender o significado nem o desenrolar da história, mas detalhes não são necessários para o que há de vir. Limitemos-nos a dizer que foi por amor. Sim, esse sujeito que teima em regular as nossas vidas. Não foi o único motivo, mas digamos que sim. Amor é um tema mais fácil e dá mais leitores do que mortes de familiares, do que desgraças e desacordos dentro de uma família. Continuando. Para se seguir em frente, há que tomar decisões. O rapaz tomou uma. Afastar-se e afastar. Fingiu, mentiu. Algo que tinha prometido nunca fazer. Foi um fingidor. Enganou para o seu próprio bem e para o dos outros. Actuou, representou. E ninguém se apercebeu. O que fez ou deixou de fazer, pouco importa e poucos sabem. Fingiu uma paranóia e foi mais louco do que na realidade era. Mas como disse, o rapaz não era tolo de todo. Fazia-se de tolo quando a ocasião o exigia, e só era verdadeiramente tolo quando estava distraído. Tudo o que fazia tinha um propósito e um fim. Podia não ter muito, mas força de vontade e de decisão tinha. Mesmo quando parecia que não tinha. O possível leitor continua atrapalhado, como seria de esperar. Mas para um contador de histórias, algo que todos somos, é difícil contar uma história de que pouco se sabe mas que se presume muito. No entanto existia um objectivo. O rapaz queria seguir em frente. E sabia como o fazer. Coragem para o fazer? Foi precisa muita. Sofreu? Claro, todos sofremos. Mas foi o melhor através do pior? Foi. Dia após dia, temos que enfrentar um imenso palco, onde actuamos para milhares e com milhares. Temos que actuar conforme a situação. Maus actores? Apenas os menos corajosos.
O que é feito do rapaz, que ninguém sabe bem o que lhe aconteceu e que poucos sabem o que fez. Destruiu-se. Mas renovou-se e continuou. Tomou decisões e deixou de ser um rapaz. Fez uma operação de mudança de sexo. Na realidade tornou-se num homem. Aventureiro? Com limites. Crescera com estabilidade e gostava dela. Precavido e acordado? Sem dúvida. Iludiu muita gente. Não era poeta, mas era fingidor. E tinha mais necessidade de o ser do que os outros.
Moral da história? Devaneios. Uma história mal contada, que quer ser contada, mas que é perigosa de se contar. A simples lição é esta, possível leitor. Devemos escrever do que sabemos e do que vimos. Devemos ter cuidado com o que escrevemos. Devemos escrever para nós próprios, mas não devemos viver o que escrevemos. Esse é o papel dos leitores. Mas em relação ao que sabemos e ao que vimos, sabemos se o imaginarmos. Devemos ser vagos, mas precisos, egocêntricos e pretensiosos. Devemos ser nós próprios mas devemos também ser actores. Devemos ser humanos. Escrever como se soubéssemos tudo, mas pensar como se não soubéssemos nada.

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