segunda-feira, 30 de julho de 2012

O mundo dos outros.

Era uma vez um rapaz que vivia no mundo dos outros, deslocado mas despreocupado. Teria criado um mundo para si próprio, se tivesse paciência e não fosse tão preguiçoso e do lema “deixa fazer para amanhã”. Não que tivesse sido sempre assim, mas descaiu-se em demasiada. Criou então, porque dava menos trabalho, uma frágil mas grande bolha de sabão invisível. Não era impenetrável, mas dava-lhe uma sensação de segurança e tranquilidade. Debatia consigo próprio assuntos que não lembravam nem interessavam a ninguém, e idolatrava heróis de bigode. A vida ofereceu-lhe desgosto, amargura, desilusão, mas ele nem reparou, de tal maneira que estava distraído e entretido na sua bolha, com os seus devaneios e imaginações. O mundo dos outros era estranho. Milhares de pessoas iguais entre si. O rapaz bem que ouvia rumores de que havia alguém como ele, mas nunca teve grandes esperanças. O mundo dos outros era um mundo mentiroso de gente mesquinha e pouco inteligente. Mas o rapaz não era sempre preguiçoso, era curioso e muitas vezes determinado, e de vez em quando, abandonava a sua bolha e vagueava sem protecção pelo mundo dos outros, interessado em descobrir novas pessoas e coisas. Era teimoso e valente, mas ia sempre precavido, e ansioso por aventuras. Sentia-se deslocado, mas pelo mundo dos outros tinha um enorme fascínio, estranho e incompreensível. Identificava-se com os seus problemas, mas achava-os patetas. Que mundo sedutor e irritante. Só que um dia, aventurou-se em demasia pelo mundo no qual vivia, mas que não era seu. Foi magoado e ficou de coração despedaçado. E não conseguiu encontrar a sua bolha de sabão, que tanto estimava e que tanto o protegia. Ficou triste e a sofrer. Sem amigos, sem ninguém. Refugiou-se nos sonhos e por momentos esqueceu a preguiça e criou um mundo para se proteger, um mundo bizarro e alucinado, confuso e desorganizado, mas seu. Mas fechou-o a sete chaves, para nunca ser encontrado, e adormeceu a valentia, adormeceu a dedicação, e mergulhou num mar sombrio. Abandonou o mundo dos outros, perdeu-se no seu, perdeu-se nos seus sonhos infindáveis. Não eram estáveis, mas eram mais calmos do que o que o esperava no mundo dos outros. E era ele o supremo governante. Ele gostava dessa ideia.

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